domingo, 29 de agosto de 2010

Meio Metro de Homem Bacalhau

Personagens das ruas de São Paulo do final do século XIX

Os meninos o chamam de “Meio Metro”, seu nome de batismo é Rufino. Era um pretinho de um metro e quarenta de altura, com uns cinqüenta anos de idade. Com todo este tamanho não se pode dizer que é um anão, mas também não é um homem alto. Assim, o fato de ter um metro e meio é tudo que vale na sua vida social.

“Meio Metro”, seria para si mesmo antes um homem alto do que baixo. HomemBacalhau

Um dia quando ia pela rua a molecada o gritou “Meio Metro” e ele estava ofendido. Quando a molecada se aproximou, Meio Metro achou mais conveniente embravecer muito, senão se afastariam, e lhe faltaria auditório para demonstrar sua superioridade.

E não perdeu a oportunidade e foi logo dizendo:

- Vocês são uns meninos malcriados. Vocês conhecem Padre Cícero? Em dia de procissão na Sé, está tudo arrumado desde cedo dentro da igreja.

Gente começa a perguntar para Padre Chico: - Padre Chico, a procissão não sai? – Padre Chico responde: - Espera um pouco. Gente pergunta outra vez: - A procissão não sai? – Padre Chico responde: - Onde está Rufino? Rufino não chegou? Então a procissão não sai. Rufino é que abre a porta da frente da igreja. Enquanto Rufino não Chega a procissão não sai.

Quer pessoa maior que isso?

O homem teria sessenta anos. Quando distava meio quarteirão, já se via a barba longa, descendo até a cintura.

Mais perto, via-se que não acabava ali. Estava enrolada no braço esquerdo.

O homem parava, e quando perguntavam pelo comprimento da barba, ele a soltava até os pés, muito fina e de poucos fios na extremidade.

Abaixava o rosto e a barba tocava o chão.

Então tirava o chapéu e estendia a barba para o grupo que se formava ao seu redor. Os curiosos davam-lhe alguns vinténs. O homem dizia “Deus lhe pague”, punha o chapéu na cabeça, enrolava a barba no braço esquerdo e seguia.

Padre Bacalhau parece que enlouqueceu. Não podia dizer missa. Magro, que não podia ser mais magro. Pequeno recurvado. Cruzava as mãos sobre as costas, e sobre a mísera roupa, uma capa, azul por fora, vermelha por dentro, batendo na canelas.Ia silencioso, magro e recurvado, com as mãos nas costas. O meninos gritavam – Padre Bacalhau – Padre Bacalhau!

Ele não respondia. Caminhava, caminhava. Não sabemos onde morava, nem onde comia. Mas quando ele passava a molecada gritava. Padre Bacalhau, Padre Bacalhau e ele não respondia e continuava caminhando com as mãos nas costas.(1)

(1) Americano, Jorge – São Paulo naquele tempo 1895-1915.

Nenhum comentário:

Postar um comentário