Outro momento importante, no
sentido de assegurar a estabilidade econômica, foi a criação da Caixa de
Conversão, implantada através do Decreto n. 1.575, de 6 de dezembro de 1906.
Seu funcionamento efetivo se deu em 23 de dezembro do mesmo ano. Em linhas
gerais seu mecanismo funcionava da seguinte forma: estabeleceu-se um fundo destinado
a receber moedas de ouro. Deste modo, a Caixa de Conversão, estando lastreada
sob esse ativo, poderia emitir notas plenamente conversíveis em ouro de curso
legal, em forma de bilhetes ao portador, até o valor de 320 mil contos de réis
ou 20 milhões de libras esterlinas, ao câmbio fixo de 15 esterlinos por
mil-réis. As notas devolvidas ao fundo seriam imediatamente incineradas. Estava
implantado o padrão-ouro que funcionaria até 1914.
Lastro em ouro para as aplicações |
A criação da Caixa de
Conversão deve ser entendida dentro de um contexto mais amplo. Ao fim do século
XIX, a Inglaterra era a maior potência comercial e financeira mundial e,
portanto, seu padrão monetário de trocas foi adotado aos poucos pela maioria
dos países centrais e periféricos. Era o “Gold Standard”. Somente
após sedimentar-se o ouro como base de troca entre os países, o metal passou a servir
como meio de pagamento dentro do país, estabelecendo-se o câmbio fixo, onde tal
padrão fosse adotado. Para que tal regime fosse mantido, sem grandes colapsos,
era imprescindível a existência de um Banco Central no país. Sua função seria
restabelecer os fluxos de entrada de ouro, em caso de uma grande evasão do
metal, através da elevação da taxa de redesconto.
Tal assunto tem uma vasta
bibliografia45 e inúmeros pontos a serem a analisados. Nossa intenção será
apenas comentar, de forma genérica, os naturais obstáculos gerados pela adoção
do padrão-ouro até 1914, no centro e na periferia, além das vantagens e das
restrições sentidas pelos bancos comerciais nesse contexto.
Nos primórdios da vigência do
padrão-ouro, em países centrais, os bancos comerciais
apresentavam grandes riscos de
quebras bancárias devido à falta de apoio do Banco Central do respectivo país a
uma eventual crise. Essa omissão é explicada da seguinte forma: caso o Banco
Central atuasse como “emprestador de última instância” concedendo a devida
assistência aos demais bancos comerciais em risco, ao prover-lhes a liquidez
adicional necessária para que pudessem enfrentar a crise, criar-se-ia a
possibilidade de por em risco o padrão-ouro, pois a proporção entre papel-moeda
e as
reservas de ouro no país
poderiam cair abaixo do fixado em lei.
Cabe ressaltar que em
situações excepcionais, na qual as reservas em ouro caíssem abaixo do mínimo
fixado, o Banco Central poderia decretar temporariamente a inconversibilidade
da moeda.
Segundo EICHENGREEN, a
pretensão do Banco Central atuar como “Banco dos Bancos” poderia conflitar com
suas responsabilidades de administrador do padrão-ouro. Um exemplo elucidativo,
citado pelo autor, foi o pânico bancário ocorrido na Inglaterra em 1866. Por
causa da quebra de uma grande companhia, espalhou-se o pânico bancário no país.
O autor detalha os acontecimentos da época “(...) os bancos procuraram manter
sua liquidez descontando títulos junto ao Banco da Inglaterra. Diversos
estabelecimentos creditícios queixaram-se de que o Banco da Inglaterra
(que exercia as funções de
Banco Central) deixou de prestar a assistência adequada. Preocupado com o nível
de suas próprias reservas, o Banco da Inglaterra recusou-se a atender à demanda
por operações de redesconto. No auge do pânico, o Banco negou-se a emprestar
dinheiro contra a apresentação de títulos do governo”.
Todavia, a literatura informa
que, ao fim do século XIX, ocorreram inúmeros cenários nos quais países
centrais, ao atravessarem ocasionais perdas de reservas, tiveram o equilíbrio
de suas reservas restabelecido, não só pela intervenção clássica do Banco
Central doméstico, como também pela cooperação de outros Bancos Centrais que
emprestavam divisas em ouro.
Pelo receio de se repetir o
pânico bancário de 1866, o Banco da Inglaterra, anos depois, exerceu plenamente
sua função de “Banco dos Bancos” dando suporte financeiro a um dos maiores
bancos comerciais da Grã-Bretanha, o Baring Brothers, que se viu em posição de
insolvência, devido ao não pagamento de empréstimos volumosos que havia
concedido.
Entretanto, países periféricos,
como o Brasil, que não possuíam um Banco Central para exercer sua presença
através de taxas de juros, ficavam a mercê da influência de externalidades,
como o impacto fortuito da entrada e saída do metal.
No Brasil, os reflexos da
instalação do padrão-ouro em 1906 nos bancos comerciais, através da criação da
Caixa de Conversão, devem ser analisados de modo bastante específico, pois as
variáveis intrínsecas tanto ao padrão-ouro brasileiro quanto à conjuntura
cambial e monetária do país, à época, eram bastante peculiares.
Bibliografia:Chavantes Ana Paula – A Consolidação do Setor Bancário
em São Paulo na Década de 20 – fev 2004