sexta-feira, 4 de julho de 2014

Padrão ouro no Brasil de1914

Outro momento importante, no sentido de assegurar a estabilidade econômica, foi a criação da Caixa de Conversão, implantada através do Decreto n. 1.575, de 6 de dezembro de 1906. Seu funcionamento efetivo se deu em 23 de dezembro do mesmo ano. Em linhas gerais seu mecanismo funcionava da seguinte forma: estabeleceu-se um fundo destinado a receber moedas de ouro. Deste modo, a Caixa de Conversão, estando lastreada sob esse ativo, poderia emitir notas plenamente conversíveis em ouro de curso legal, em forma de bilhetes ao portador, até o valor de 320 mil contos de réis ou 20 milhões de libras esterlinas, ao câmbio fixo de 15 esterlinos por mil-réis. As notas devolvidas ao fundo seriam imediatamente incineradas. Estava implantado o padrão-ouro que funcionaria até 1914.
Lastro em ouro para as aplicações
A criação da Caixa de Conversão deve ser entendida dentro de um contexto mais amplo. Ao fim do século XIX, a Inglaterra era a maior potência comercial e financeira mundial e, portanto, seu padrão monetário de trocas foi adotado aos poucos pela maioria dos países centrais e periféricos. Era o “Gold Standard”. Somente após sedimentar-se o ouro como base de troca entre os países, o metal passou a servir como meio de pagamento dentro do país, estabelecendo-se o câmbio fixo, onde tal padrão fosse adotado. Para que tal regime fosse mantido, sem grandes colapsos, era imprescindível a existência de um Banco Central no país. Sua função seria restabelecer os fluxos de entrada de ouro, em caso de uma grande evasão do metal, através da elevação da taxa de redesconto.
Tal assunto tem uma vasta bibliografia45 e inúmeros pontos a serem a analisados. Nossa intenção será apenas comentar, de forma genérica, os naturais obstáculos gerados pela adoção do padrão-ouro até 1914, no centro e na periferia, além das vantagens e das restrições sentidas pelos bancos comerciais nesse contexto.
Nos primórdios da vigência do padrão-ouro, em países centrais, os bancos comerciais
apresentavam grandes riscos de quebras bancárias devido à falta de apoio do Banco Central do respectivo país a uma eventual crise. Essa omissão é explicada da seguinte forma: caso o Banco Central atuasse como “emprestador de última instância” concedendo a devida assistência aos demais bancos comerciais em risco, ao prover-lhes a liquidez adicional necessária para que pudessem enfrentar a crise, criar-se-ia a possibilidade de por em risco o padrão-ouro, pois a proporção entre papel-moeda e as
reservas de ouro no país poderiam cair abaixo do fixado em lei.
Cabe ressaltar que em situações excepcionais, na qual as reservas em ouro caíssem abaixo do mínimo fixado, o Banco Central poderia decretar temporariamente a inconversibilidade da moeda.
Segundo EICHENGREEN, a pretensão do Banco Central atuar como “Banco dos Bancos” poderia conflitar com suas responsabilidades de administrador do padrão-ouro. Um exemplo elucidativo, citado pelo autor, foi o pânico bancário ocorrido na Inglaterra em 1866. Por causa da quebra de uma grande companhia, espalhou-se o pânico bancário no país. O autor detalha os acontecimentos da época “(...) os bancos procuraram manter sua liquidez descontando títulos junto ao Banco da Inglaterra. Diversos estabelecimentos creditícios queixaram-se de que o Banco da Inglaterra
(que exercia as funções de Banco Central) deixou de prestar a assistência adequada. Preocupado com o nível de suas próprias reservas, o Banco da Inglaterra recusou-se a atender à demanda por operações de redesconto. No auge do pânico, o Banco negou-se a emprestar dinheiro contra a apresentação de títulos do governo”.
Todavia, a literatura informa que, ao fim do século XIX, ocorreram inúmeros cenários nos quais países centrais, ao atravessarem ocasionais perdas de reservas, tiveram o equilíbrio de suas reservas restabelecido, não só pela intervenção clássica do Banco Central doméstico, como também pela cooperação de outros Bancos Centrais que emprestavam divisas em ouro.
Pelo receio de se repetir o pânico bancário de 1866, o Banco da Inglaterra, anos depois, exerceu plenamente sua função de “Banco dos Bancos” dando suporte financeiro a um dos maiores bancos comerciais da Grã-Bretanha, o Baring Brothers, que se viu em posição de insolvência, devido ao não pagamento de empréstimos volumosos que havia concedido.
Entretanto, países periféricos, como o Brasil, que não possuíam um Banco Central para exercer sua presença através de taxas de juros, ficavam a mercê da influência de externalidades, como o impacto fortuito da entrada e saída do metal.
No Brasil, os reflexos da instalação do padrão-ouro em 1906 nos bancos comerciais, através da criação da Caixa de Conversão, devem ser analisados de modo bastante específico, pois as variáveis intrínsecas tanto ao padrão-ouro brasileiro quanto à conjuntura cambial e monetária do país, à época, eram bastante peculiares.


Bibliografia:Chavantes   Ana Paula – A Consolidação do Setor Bancário em São Paulo na Década de 20 – fev 2004

domingo, 29 de junho de 2014

Organização do mercado financeiro paulista

O período pós-1906 é marcado pela vigorosa alavancagem da participação dos estabelecimentos financeiros estrangeiros no mercado bancário de São Paulo, onde, dentro de poucos anos assumiriam a hegemonia deste mercado. Esta 2ª fase ainda abrange outro importante acontecimento - a reestruturação e o desenvolvimento do 5º Banco do Brasil. Este instituto estaria embutido de dupla função: agente de controle estatal sobre o setor bancário nacional e banco comercial.
O Banco do brasil jé emitiu cédulas.
Aliás, TOPIK, procura demonstrar no transcorrer de seu livro que, ao contrário do que o senso comum acredita, o Estado Brasileiro era um dos mais intervencionistas da América Latina, antes mesmo da Grande Depressão Mundial. Segundo o autor, um dos mais importantes instrumentos de intervenção do Governo Central junto ao segmento financeiro estabelecido no país, foi o Banco do Brasil.
Sentindo a necessidade de estabelecer um banco que atuasse como instrumento público federal, as autoridades monetárias juntamente com o aval do Congresso Nacional, reorganizou o antigo Banco da República sob novas bases recriando o 5º Banco do Brasil através do Decreto nº 1.455, de 30 de dezembro de 1905.
A reorganização do quinto Banco do Brasil foi o primeiro passo no sentido de normatizar, de modo mais austero, o sistema bancário, pois, além de exercer atividades bancárias comuns aos bancos comerciais, ganhou certas atribuições de Banco do Governo, cujo Presidente era nomeado pelo Governo Federal. O Banco do Brasil, além de poder emitir moeda juntamente com o Tesouro Nacional, também operaria no mercado cambial, através da abertura da Carteira de Câmbio e em atos relacionados às dívidas interna e externa, tais como operações de subscrição de títulos governamentais.
A inserção do novo Banco do Brasil no mercado de câmbio daria certas garantias ao Governo quanto a sua estabilidade, uma vez que o Poder Executivo tinha a faculdade de nomear o diretor da Carteira de Câmbio, daquele que, dentro de pouco tempo, viria a ser o maior banco nacional do país.
No que concerne a esse assunto, LEVY destaca que através do Banco do Brasil o governo poderia efetuar as políticas monetária e cambial. Não obstante, o novo órgão estava longe de ser um Banco Central, pois não era prestamista de última instancia e não possuía fundo de redesconto.
É flagrante a constatação que o discurso oficial dos agentes governamentais não equivalia às suas reais intenções.
Um exemplo significativo são as palavras de Leopoldo Bulhões, Ministro da Fazenda e mentor da reestruturação do Banco do Brasil, sobre as futuras atividades desse estabelecimento“ (...) o Banco deverá cumprir as funções de Banco Central, munido de recursos abundantes para o redesconto a outros Bancos, para conceder-lhes empréstimos, e para assisti-los em momentos de crise”.
Como se pode observar, a priori, há uma profunda contradição entre análise de LEVY sobre o papel desempenhado pelo Banco do Brasil (pelo menos nos primeiros anos de sua implantação) e as declarações de Bulhões a esse respeito. As evidências mostram que o ocupante da pasta da Fazenda era contra a ideia do Banco do Brasil poder agir como “Banco dos Bancos”. Bulhões era um monetarista ortodoxo, defensor de políticas monetárias contracionistas, sendo bastante improvável que, mesmo em caso de crise bancária aguda, desse seu aval para possíveis emissões emergenciais que provessem a caixa do Banco do Brasil de recursos para uma eventual ajuda à rede bancária.
Na verdade, os fatos mostram que, a assistência financeira prestada pelo Banco do Brasil aos estabelecimentos bancários, em épocas de colapso ou pânico bancário, foi relevante, porém, não atendeu integralmente à demanda de recursos pleiteados pelas instituições financeiras.
Após descrevermos alguns dos procedimentos mais importantes imputados ao Banco até então, pode-se concluir preliminarmente que várias de suas atribuições conferiam a este órgão status de representante do poder público no mercado bancário, respeitando os princípios da livre concorrência entre os demais bancos e prioritariamente servindo aos interesses da coletividade ao coordenar e regular
a existência e o desenvolvimento do organismo bancário estabelecido no país, por meio do exercício das prerrogativas conferidas ao banco por lei.
Mais à frente observaremos que ao longo da Primeira República, à medida que este órgão adquiria maior poder, mais eficiente tornara-se seu desempenho como órgão fiscalizador e como autoridade monetária.


Bibliografia:Chavantes   Ana Paula – A Consolidação do Setor Bancário em São Paulo na Década de 20 – fev 2004